sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Até daqui a alguns meses...

A cena da garota gritando "macaco" atrás do gol do Aranha, no jogo entre Grêmio e Santos, pela Copa do Brasil, na Arena Grêmio, é chocante, repugnante, merece todo nosso grito. Nenhum silêncio diante do racismo!

O Grêmio já protagonizou outros casos de racismo. Dirigentes, jogadores e torcedores já foram denunciados. Não na polícia, mas pela imprensa.

Bom que se diga, o Grêmio passa longe de ser o único clube a "praticar" o racismo. Não podemos isolar o clube de um comportamento comum - e abjeto - da nossa sociedade.



Porém, cabe observar que, em nenhum caso, houve punição mais severa. O racismo é uma agressão, tal como a violência que encerrou o Brasileirão do ano passado em Joinville, só que mais covarde. Em geral, é praticada contra uma única pessoa, por vários imbecis.

O racismo é uma demonstração nojenta de que não nos livramos da cultura escravagista que foi construindo cidades em nosso país brancas no meio e negras nos cantos. A garota gremista é só mais uma no meio de tantos que, inclusive, estavam próximos a ela, imitando macacos.

Há uma sede punitiva contra a garota. Resolve?

Em geral, os comentários contra a garota são reacionários, mesquinhos, preconceituosos. Enfim, um retrato fiel do mergulho que nossa sociedade deu em um tanque de fezes. Tais comentários revelam que o sujeito crítico das redes sociais é bastante nivelado por baixo.

Mas o que gostaria de tratar é, diante do que já foi apresentado, sobre o início da contagem regressiva para o próximo caso de racismo no futebol. Sendo específico, porque se abrir o leque terei que largar o banco para me dedicar somente aos posts sobre racismo.

Só neste ano, dois jogadores do Santos foram vítimas de racismo. Arouca, no Paulista, e agora Aranha. Ainda teve o caso do Tinga, no Cruzeiro. O torcedor do Bayern de Munique, na Alemanha.

Eles não acabam porque quem investiga é racista, quem julga é racista, quem executa a pena é racista, quem torce é racista, quem joga é racista, quem apita é racista, quem dirige o futebol é racista. No meio de tudo isso, o negro e sua impotência diante de tamanha "torcida adversária".

Por isso, geralmente, ele não leva adiante. Não vai às últimas consequências.

Se fosse, a garota estaria na cadeia, junto com os outros que imitaram macacos, Antônio Carlos não daria sequer um pito no futebol brasileiro, entre outros exemplos.

Enquanto ninguém punido, nada avança. Mas só a punição é insuficiente, nós temos é que enterrar a escravidão de uma vez por todas. Na escola, na família, na igreja.

Estamos bem longe de uma solução, mas bem próximos do próximo caso de racismo no futebol.


Valeu,

Bruno Porpetta

terça-feira, 26 de agosto de 2014

Torcida que canta e vibra, há 100 anos

Sou Flamengo! Até as pedras portuguesas de calçada sabem disso. Algumas até ousam me sacanear nas derrotas. Outras sorriem para mim nas vitórias.

Mas devo confessar que o Palmeiras me traz lembranças interessantes. Pro bem e pro mal.

A primeira lembrança que tenho do agora centenário Palmeiras foi em uma derrota, digamos assim, vexatória. Assisti à final do Campeonato Paulista de 86, onde a Inter de Limeira sagrou-se campeã ao derrotar o Palmeiras. O alviverde da capital foi, em várias ocasiões, a alegria do interior.

Mas tem uma lembrança que, sinceramente, me deixa puto até hoje.

Em 88, o Zetti - então goleiro do Palmeiras - quebrou a perna em um lance no Maracanã, contra o Flamengo, e o Gaúcho (que depois seria campeão brasileiro pelo Flamengo em 92) acabou indo pro gol. O jogo terminou 1 a 1 e, por conta do regulamento daquela Copa União, foi para os pênaltis.



E não é que o filho da puta, além de fazer o dele, ainda pegou dois?

Pois é, ainda teve o dia em que eu fui "palmeirense". A convite de um grande amigo, fui ao Palestra Itália assistir a um jogo contra o Deportivo Tachira, da Venezuela, pela Libertadores.

O Parque Antártica era (até porque aquele já não existe mais) um estádio ótimo para assistir futebol, menos para os visitantes. A torcida adversária ficava de frente para a piscina e assistia ao jogo com a cabeça virada pro lado. Fui para assistir decentemente a um jogo no Parque Antártica.

Este meu amigo estava acompanhado por outro, que mais adiante, nós três, juntos com um sãopaulino, formaríamos uma banda, mas aí é outra história.

Tinha visto este cara uma vez na vida, o bastante para ter falado de futebol por umas duas horas e meia. Ele me reconheceu algum tempo depois.

- Você não é...

- Sim, sou! (dei um abraço nele e continuei) Agora, fique em silêncio, senão eu vou morrer aqui.

O Palmeiras ganhou por 2 a 0, e não pude ser acusado de pé frio. Depois, fomos beber cerveja e comer os excelentes sanduíches de linguiça no entorno do estádio.

Ir ao Parque Antártica como visitante era uma tortura. Não era fácil ter que usar casaco no verão para esconder a camisa do Flamengo e, via de regra, você chega ao estádio no meio dos palmeirenses. Em algum lugar, você vai encontrá-los. Seja no metrô ou no entorno.

Além de tudo isso, outros confrontos entre Flamengo e Palmeiras foram bastante marcantes para mim. A final da Copa Mercosul, que ganhamos lá no Palestra, com gol de Lê. O confronto na Copa do Brasil, onde fomos eliminados, perdendo por 4 a 2, com dois gols iguais e os dois com falta no Clemer (que a porcada nunca vai admitir).

Resumindo, o Palmeiras é um gigante do futebol brasileiro pelo qual tenho um profundo respeito. Por isso, não poderia me furtar a contar estas histórias no dia de seu centenário.

O alviverde do Parque Antártica possui torcedores fanáticos. Uma torcida que me deu grandes amigos, pelos quais, às vezes, sinto até pena pelo estado crítico que o Palmeiras vive.

O Palmeiras me deu até ídolos, como Marcos, que é mais humano que a média dos jogadores de futebol no Brasil. O cara é campeão da Libertadores e para em posto de gasolina pra beber um vinho e comemorar com outros torcedores. Toma café durante um jogo de Libertadores. É campeão do mundo pela seleção. Como não gostar de um cara desses?



Ao Palmeiras, meus sinceros parabéns! Desejo que protagonizem ainda grandes confrontos com o Flamengo, para sempre.

Mas não me peçam pra chamar a "arena" pelo nome novo. Não tenho contrato com ninguém pra ficar fazendo propaganda. Vai ser sempre Parque Antártica, ou Palestra Itália.


Valeu,

Bruno Porpetta

Por que o 10 não joga?

O Brasil, desde a Copa do Mundo, fez uma opção por jogadores rápidos no meio-campo. Estes roubam a bola no campo defensivo, partem em velocidade para o ataque. Não trocam passes, nem sentam na bola quando é preciso diminuir o ritmo.

O futebol brasileiro sente falta de um autêntico camisa 10, alguém que dite o ritmo da partida e até mesmo o giro da Terra. Este jogador, gostando ou não, é Paulo Henrique Ganso.



Ele é irregular, não é protagonista no São Paulo, como não era no final de sua passagem no Santos. Na prática, foi responsável só pelo título paulista do Santos, em 2010.

Depois, foi soterrado por suas lesões e pela ascensão do craque Neymar. O cara que se recusou a sair de campo, dando bronca no treinador, naqueles tempos, nunca mais voltou.

Poderia ir à Copa, mas não fez nada para merecer a convocação, a não ser o jogador que é. Um craque!

Quer saber outra? Não precisa nem ser titular, pode ser apenas uma opção. Mas não pode ficar de fora.

Um jogador como Ganso pode parecer antiquado. Afinal de contas, a Alemanha foi campeã do mundo sem um cara exatamente assim. O mais próximo é Schweinsteiger, que joga como “volante”.

Que se dane o mundo! Um cara como Ganso pode trazer de volta uma ideia de futebol que estão tentando enterrar desde 82. Não ganhamos, mas é uma das maiores seleções da história das Copas. Com beleza, que é uma marca nossa.

Está aí nosso grande problema. A cada derrota, fomos “aprendendo” algo com os europeus. Revivemos tempos de Cabral, com a aristocracia da bola sentindo orgulho das influências coloniais do Velho Mundo.

E assim vamos abrindo mão de todas as nossas características, cultuando volantes e mais volantes. A ideia do “feio que vence” predomina, mesmo que tenha perdido mais do que vencido.


Enquanto isso, o Ganso faz golaços pelo São Paulo...



Valeu,

Bruno Porpetta

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Para onde pende a gangorra?

Não faz muito tempo, vascaínos criticavam muito Adilson Batista. Ao mesmo tempo, o treinador Cristóvão Borges era motivo de orgulho para os tricolores.

O primeiro, tropeçava na Série B. A ponto de outras torcidas pensarem na absurda hipótese de queda para a C.  O segundo, tinha o time de maior índice de acerto de passes e, até então, o futebol mais bonito do Brasileirão.



De repente, as bombas eleitorais no Vasco começam a cair. Suspeita de compra de votos, eleitores mortos aptos a votar e nomes que podiam votar duas vezes. A eleição está na justiça, inclusive. E o Vasco, dentro de campo, vai reagindo e subindo na tabela.

No Fluminense, a hecatômbica derrota para o América-RN. Os cinco gols sofridos, sendo quatro só no segundo tempo. Uma virada histórica e uma eliminação terrível. Depois, ainda teve o clássico com o Botafogo. Mais uma derrota.

Adilson Batista, por um lado, gosta de um time bem fechado na defesa. Aposta nas bolas em Douglas – que vem sendo decisivo – para a distribuição do jogo. O meia é o termômetro do time. Vai bem, o time joga. Quando não...

Cristóvão continua o mesmo. Faz um belo trabalho, mas é pressionado pelas más atuações recentes do time. Pouco se fala sobre as razões da queda de produção.

Está se tornando pública a discussão sobre premiações da equipe. A patrocinadora está fechando a torneira e o debate, obviamente, se acalora. Alguns jogadores importantes estão em processo de renovação de contrato, como Cavalieri e Carlinhos. São bons dados para se encontrar uma razão para a queda do time em campo.

É bom que se diga, os jogadores estão cobertos de razão.


Portanto, é bom que se valorize os méritos de Adilson no Vasco, como blindar a equipe daquilo tudo. Por outro lado, é fundamental manter Cristóvão com liberdade para montar o time. Com ou sem Fred.


Valeu,

Bruno Porpetta

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Que dia! Que noite!

Este 13 de agosto de 2014 tem tudo para ser uma data lembrada por muito tempo na história.



Começa com a trágica morte de Eduardo Campos e os demais passageiros e tripulantes do avião que caiu na minha cidade natal. Exatos nove anos depois da morte do avô do presidenciável, o lendário Miguel Arraes.

Não deixa de ser lamentável, pelas pessoas que cercavam suas vidas. Também não os redime de eventuais equívocos em vida, e Eduardo Campos tinha vários equívocos.

Mas como qualquer grande "evento" que envolva política, algumas reações chegam a dar náuseas em qualquer um que possua senso de humanidade e, principalmente, de ridículo.

Passam as horas e a noite reserva uma rodada incrível da Copa do Brasil.

Três gigantes do nosso futebol estão fora, eliminados por times considerados pequenos, mas que se mostraram tão gigantes quanto os derrotados.

O Bragantino não tinha uma noite tão heroica desde o título paulista em 90. Tempos em que a linguiça de Bragança Paulista ainda era notícia. E o São Paulo vai lamber suas feridas no Brasileirão e na Sul-Americana.

O Ceará, que já havia vencido o jogo de ida, em pleno Beira-Rio, venceu de novo. Fez 5 a 2 no agregado e despachou o Inter com uma autoridade monumental.

No Maracanã, o Fluminense, que por muito tempo se regozijou com a histórica derrota do Flamengo para o América do México e a atuação exuberante do gordinho Cabañas, agora também tem um América pra chamar de seu. O América de Natal-RN conseguiu improváveis, mas merecidos, 5 a 2 e reverteu a derrota por 3 a 0 na primeira partida, se classificando pelos gols fora de casa.

Para completar, houve a grande final da Libertadores (que as TV's brasileiras se recusaram a exibir, mostrando, mais uma vez, que nossa mídia simboliza os "valores" das nossas elites, que se orgulham de odiar os vizinhos sul-americanos) que consagrou, pela primeira vez, o San Lorenzo como campeão. Tudo decidido em um pênalti cobrado pelo paraguaio Ortigoza para o time argentino, sobre o goleiro argentino Don, dos paraguaios do Nacional.

Este papado argentino tem feito tão bem ao futebol do país que já levou a seleção à final da Copa e o San Lorenzo (time do Chico) ao título inédito da Libertadores. Divino?


Valeu,

Bruno Porpetta

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Pode ser a gota d'água...

Luiz Antônio é suspeito – e é bom que se diga que, por enquanto, é apenas suspeito – de ter relações com milicianos da zona oeste do Rio, além de estelionato pelo golpe no seguro de seu carro.



Se confirmadas as suspeitas, além do provável fim de carreira para um garoto promissor, revela que nem só de amigos de infância são formadas as redes de relações entre jogadores de futebol e suas comunidades.

Diferentemente das histórias de Adriano e Vágner Love, que mantinham relações com traficantes em seus locais de nascimento porque, simplesmente, cresceram juntos, aprenderam a dar os primeiros passos no futebol juntos. Portanto, não há razão, mesmo que os caminhos tomados tenham sido absolutamente diferentes, para que seus vínculos sejam rompidos.

Este caso de Luiz Antônio não se trataria de amizade de infância. Até porque os milicianos, em geral, caem de paraquedas nas comunidades, surgem como “alternativa ao domínio do tráfico”, mas se configuram como os novos donos do pedaço. Estabelecem uma relação de poder sobre a comunidade.

É neste aspecto que se firmariam as suspeitas. Nas relações de poder que as milícias exercem sobre as comunidades e sobre como um jogador de futebol conhecido pode ser útil à manutenção destas relações.

A princípio, o único indício mais forte seria o do estelionato. Um golpe, até certo ponto, conhecido aí na praça. Não é incomum alguém querer se livrar de um carro através do acionamento do seguro.

O que causa maior estranhamento é que, em geral, não se faz isso com quem não se tenha uma relação mínima de confiança. É aí que mora o perigo.


Somando-se à confusão na justiça do trabalho, no início deste ano, é o segundo episódio conturbado envolvendo Luiz Antônio que parece não carecer apenas de boa assessoria, mas de cabeça no lugar.


Valeu,

Bruno Porpetta

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

“A estrutura do nosso futebol é reacionária, corrupta e corruptora”

JUCA KFOURI – Um dos mais conceituados jornalistas esportivos do país fala ao Brasil de Fato



Por Bruno Porpetta (RJ)

José Carlos Amaral Kfouri ou, simplesmente, Juca é cientista social de formação, mas foi no jornalismo que deixou um legado fundamental. É uma referência de jornalismo esportivo comprometido com os fatos e o crescimento do esporte no Brasil e tal postura, por si só, o fez romper com os círculos de poder dos dirigentes.

Nesta entrevista, Juca analisa a situação do futebol brasileiro e suas perspectivas após a votação do Proforte, a Lei de Responsabilidade Fiscal do futebol, sem poupar ninguém e da maneira que o notabilizou, com independência. Confira:

Brasil de Fato – Às vésperas da votação do Proforte, na Câmara, a presidenta Dilma se reuniu com o Bom Senso numa semana e na outra semana com os clubes. O que está exatamente em jogo?

Juca Kfouri – Está em jogo, de fato, que ao invés de mudar o modelo de gestão do futebol brasileiro, vamos ter mais uma maneira de disfarçar os problemas deste modelo, que é aprovando aquilo como os clubes querem, um “me engana que eu gosto”. Eles vão fingir de novo que vão pagar as dívidas e não vão ser responsabilizados se não pagarem.

A contrapartida a esta possibilidade é que se aprove aquilo que o Bom Senso quer, propondo que, a cada benefício que os clubes consigam na renegociação da dívida, haja uma responsabilidade correspondente. Foi este o compromisso que a Dilma assumiu com o Bom Senso FC. Fazer desta nova legislação um dos legados para o futebol após a Copa do Mundo.

Então ou vamos ter, neste Proforte, uma forma disfarçada da Timemania, ou teremos uma nova lei que faça com que os clubes se responsabilizem por aquilo que fazem na gestão do seu dia-a-dia.

Brasil de Fato – Algumas diretorias eleitas em clubes representaram um “sopro de esperança” no futebol brasileiro, como Belluzzo (Palmeiras), Dinamite (Vasco), Bandeira de Mello (Flamengo) e Bebeto de Freitas, sucedido por Maurício Assumpção (Botafogo). Por que fracassaram neste sentido?

JK – O problema estrutural é tão grande, tão forte, a estrutura do nosso futebol é tão reacionária, tão avessa a qualquer tipo de mudança, tão corrupta e tão corruptora, que a questão não se altera com nomes. As pessoas acabam tragadas por essa estrutura.

O melhor exemplo é o do Belluzzo. Eu cheguei até a escrever, depois da malfadada gestão dele no Palmeiras, que se o Belluzzo fracassou, eu fracassaria mais ainda do que ele, porque ele é mais bem preparado do que eu. Precisa mexer é nessa estrutura, de forma tal que, democratizada, ela permita um respaldo a quem venha gerir o futebol de forma diferente do que temos hoje.

Durante muitos anos, achei que um Dinamite no Vasco, um Zico no Flamengo, um Rogério Ceni no São Paulo, seriam soluções. Não são nessa estrutura, porque eles tem que se adaptar a ela, tem que prestar vassalagem à CBF.

Houve uma inversão no nosso futebol. A CBF, que deveria ser uma entidade a serviço dos clubes, virou uma entidade a serviço de si mesma. As federações, que deviam ser meios, viraram fins. E os clubes acabam se submetendo a isso de maneira subserviente.

Mexer na estrutura significa, por exemplo, os clubes se transformarem em sociedades empresariais. Não como na Inglaterra, que permite que um sheik ou um milionário russo compre um clube, mas como na Alemanha, que se garanta 51% para os sócios, permitindo uma gestão profissional, empresarial.

Brasil de Fato – A Copa Verde, projeto da CBF para atender a reivindicação de centros menos desenvolvidos, como o Norte, o Centro-Oeste e o Espírito Santo, para jogar um torneio mais rentável e visível. Não deu certo e, além disso, o campeão foi definido no “tapetão”. O que dizer sobre isso?

JK – Então, aí você tem duas questões. A primeira questão é a criação de paliativos. Por exemplo, um bom paliativo é a Copa do Nordeste, mas é por muito menos tempo do que deveria. Quais as duas questões centrais pro Bom Senso FC? O fair play financeiro, e o calendário do futebol brasileiro. Que é o calendário do único exército que tá marchando de um jeito, enquanto todos os outros marcham de outro jeito. Não se trata mais de falar da adequação ao calendário europeu, mas sim ao calendário mundial.  É o que, não apenas a Europa, mas a Argentina, México, Uruguai... Enfim, os países que contam no mundo do futebol hoje têm. Por questões eleitorais, pra manter as capitanias hereditárias e esse modelo coronelista do nosso futebol, você tem os campeonatos estaduais.

É incompatível com qualquer solução, de médio ou longo prazo, para os clubes menores, que os campeonatos estaduais permaneçam como estão.

O Tribunal de Justiça Desportiva, da maneira como é feito no Brasil, vira um instrumento de poder. Ele tem a mesma eficácia da escala de árbitros que, por mais que você tente minimizar com sorteios e tal, permanece sob administração das entidades dirigentes. Tanto a arbitragem como a justiça desportiva deveriam ser instituições absolutamente independentes das federações e dos clubes. Na verdade, as federações não fazem mais nenhum sentido. Federação de futebol estadual é como jaboticaba, só tem no Brasil.

A justiça desportiva tem que ser, por exemplo, como a gente vê na Copa do Mundo, que é o chamado rito sumário. Você tem lá o regulamento, as faltas, o que equivale a cada falta em termos de punição e simplesmente aplicar. Não essa palhaçada bacharelesca que a gente tem no Brasil. Tão simples quanto isso, mas é muito difícil porque é um instrumento de poder. Faz parte dessa estrutura podre do nosso futebol.

Brasil de Fato – Como a CBF é uma entidade privada, há uma série de dificuldades do ponto de vista legal para mudanças. Quais os caminhos para democratizar a CBF e o papel do governo e da sociedade nisso?

JK – O papel da sociedade, infelizmente, até hoje a gente não viu no que diz respeito a CBF. A gente vê torcedor se mobilizando pra ir bater em jogador em treino de time quando perde no domingo, e a gente não vê mobilização em torno da exigência de democratização da CBF, nos clubes e tudo mais. O torcedor, por enquanto, se restringe à questão dos resultados dentro de campo e a sua indignação não passa disso, porque ele não vê a questão estrutural.

Quanto ao fato da CBF ser uma entidade privada, é sim, mas de óbvio interesse público. O futebol é considerado, pela Constituição, patrimônio cultural do povo brasileiro. É, portanto, submetido à fiscalização do Ministério Público Federal. O hino que toca quando o time da CBF perfila antes de um jogo não é o hino da CBF, é o hino do Brasil. As cores do uniforme não são as cores do time da CBF, são as cores da bandeira do Brasil.

Existe um artigo na Constituição que é muito usado, de maneira desonesta, ou por ignorância, inclusive, do Judiciário brasileiro, que é o artigo 217. Fala da autonomia das entidades dirigentes, é o mesmo escudo que a CBF usa por não se abastecer de dinheiro público, diferentemente dos esportes olímpicos. Há uma decisão do STF, do ex-ministro Cezar Peluso, o último ato dele como ministro do STF, numa ADIN contra o Estatuto do Torcedor, exatamente por, de alguma maneira, interferir nessa tal autonomia.

O relatório do Peluso, aprovado por unanimidade no STF, é no sentido de que autonomia não equivale a soberania.

Por exemplo, a universidade pública brasileira é autônoma, e é bom que seja, mas isso não dá a uma faculdade o direito de estabelecer o currículo que ela queira. Quem estabelece o currículo é o Ministério da Educação, o Estado brasileiro.

A autonomia deveria ter este limite. Acaba não tendo, não só porque nós estamos no país dos bacharéis que gostam de trabalhar a ambiguidade, como porque há uma grande ignorância por parte dos juízes todas as vezes que essa questão aparece. Quando as entidades se defendem falando em nome da autonomia, boa parte dos juízes desconhece essa decisão da STF. Então o caminho é uma PEC, que o governo deveria propor para eliminar de vez essa dúvida e acabar com essa coisa da autonomia posta nesses termos.

Brasil de Fato – Dunga pode estar envolvido com agenciamento de jogadores, além de Gilmar Rinaldi ter deixado de ser empresário da noite para o dia, antes de assumir o cargo de diretor de seleções. O que propõe a CBF com estas novas nomeações?

JK – O passadismo, a mercantilização, a pouca transparência, a pouca vergonha. A CBF é responsável por transformar a seleção brasileira na grande grife do nosso futebol, em detrimento dos clubes. Eu sou de uma época em que, uma excursão do Santos de Pelé, era paga com valores comparáveis ao que se pagava por um amistoso da seleção. Da mesma maneira, o Botafogo de Mané ou o Palmeiras de Ademir da Guia. Isso acabou.

A CBF faz um calendário que impede que os nossos clubes façam jogos durante o período de pré-temporada na Europa, ela vende a sua camisa em todas as lojas esportivas do mundo e você não encontra uma camisa de clube brasileiro nelas, embora encontre de argentinos.

Você encontra do Boca, do River, mas não encontra do Flamengo, time mais popular do país. Não encontra do Santos de Pelé, do Corinthians, bicampeão mundial. Tem do Bayern, do Milan, da Juventus, do Barcelona, do Real Madrid, do Paris Saint-Germain e dos times argentinos. Esta é uma política deliberada de uma entidade que se compraz de ver o nosso futebol como mero exportador de pé-de-obra, nós em vez de exportarmos o espetáculo, exportamos os artistas.


Como se a Disney, em vez de vender seus filmes, vendesse o Pato Donald, o Mickey e o Pateta. É isso que nós fazemos. Então esta é uma política deliberada e deletéria, aprimorada pelo Ricardo Teixeira, sob as luzes de João Havelange.


Valeu,

Bruno Porpetta

Sim, é só porque ele é preto!

Em tempos de reflexão sobre as lições deixadas pelos sete gols alemães na Copa, já se falou muita bobagem, mas também muita coisa relevante.

Dentre as maiores bobagens, a entidade que diz que administra o nosso futebol - a tal da CBF - responde por 96% delas. Falam e fazem, por supuesto.

Um tanto vem da imprensa, outro tanto dos treinadores - dentre eles o "pofexô" -, algum tiquinho da torcida. Ou seja, todo mundo já falou alguma bobagem de lá pra cá.



Dentre as coisas relevantes, uma delas foi Tite, que preferiu estudar mais para melhorar e chegar à Europa. O "mais cotado" antes da escolha de Dunga, quer chegar ao continente europeu, em um clube grande, porque lá é o exemplo. Pode quebrar a cara, mas não custa tentar.

Outro é Cuca, que parece ter se livrado da "uruca" de não ganhar nada. Já tem uma Libertadores no currículo, mas alguém com uma Libertadores não poderia ir pra China. Vai aprender o quê lá? Mandarim?

Muricy é outro que parece, pelo menos, estar atento às lições que o mundo lhe dá. Depois da surra que levou do Barcelona, pelo Santos, ele vem procurando mudar seus conceitos, tentando manter seu time mais com a bola nos pés e menos sobrevoando as cabeças. Não dá pra dizer que ele não está tentando.

O problema é que, em todos os aspectos positivos que o futebol brasileiro vem tentando se arrumar, sempre está associado um treinador branco, um visionário.

É nesta invisibilidade dirigida que, muitas vezes, deixamos passar batido o que tem realmente impressionado neste Brasil pós-goleada. Quem parece ter entendido tudo, até porque não precisou da goleada para aprender, já via tudo isso rolando aqui mesmo, é um negro.

Cristóvão Borges assumiu uma bucha no Vasco, logo após o AVC de Ricardo Gomes, que poucos teriam peito pra assumir. Levou o time na Libertadores e, não fosse o gol perdido pelo Diego Souza, estaria, no mínimo, nas semifinais da competição com um time bom, mas que não passava muito disso.

Algum tempo depois, sucumbiu à pressão da torcida vascaína e saiu. Não saiu correndo atrás de outro clube dias depois. Foi pra sua casa estudar.

Enquanto os jornalistas estão preocupados em saber quantas milhas os treinadores andaram acumulando em seus cartões-fidelidade de companhias aéreas indo para a Europa, Cristóvão diz ao blog do PVC que viajou pouco, suas reflexões vem de leitura e observação de algumas coisas bem mais próximas. Sampaoli, no tempo de Universidad do Chile, foi um dos alvos de seus olhares.



Depois de uma passagem pelo Bahia, em que conseguiu fazer um time sofrível permanecer na primeira divisão, Cristóvão tem uma grande chance no clube que o projetou como jogador. O Fluminense.

Nesta história de valorizar o passe como um fundamento sem igual na arte de ganhar bem os jogos, Cristóvão faz do Fluminense o time mais bonito de se ver. E ganha!

Mas sabe porque se pensa em Tite, se fala em Muricy e se traz o Dunga sempre? Pra além da panelinha da cúpula da CBF, é porque o Cristóvão é negro! Por isso o nome dele sequer aparece, mesmo que o seu trabalho venha dando frutos.

É simples. Somos um país racista, imagina a CBF?

E não acho que esta era a hora dele, nem a ocasião. Ele precisa de um título polpudo pra chamar de seu, além disso entrar na seleção agora significa baixar a cabeça pra essa gente, coisa que ele nunca deve fazer.

Não é preciso transpor simplesmente o esquema alemão para cá, basta ocupar bem os espaços. Isto faz muita diferença no futebol.

A lição alemã passa mais pela organização do futebol, que é justamente quem não quer aprender nada.

E tenho dito...


Valeu,

Bruno Porpetta

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Vergonha própria e alheia

A tendência mais provável é que, diante da péssima repercussão que a votação imediata do Proforte pode ter, ela ocorrerá após as eleições. Mais um sinal de que as eleições são só um ponto da curva e a nossa participação não pode se restringir ao simples ato de votar.

Vejam só quem são os nossos dirigentes!



O dentista que preside o Botafogo afirmou em um programa de TV que deixou de pagar impostos por oito meses contando com a votação do Proforte. Em qualquer lugar sério, sairia algemado dos estúdios. Pelo contrário, ele vai à Brasília ameaçar tirar o time de campo caso não seja atendido por um pacotão de bondades do governo.

O Flamengo deve até as calças. A simples ideia de pagar 900 mil reais por mês a Robinho merecia desprezo, mas a atual diretoria ressuscita as múmias da política rubro-negra que, a todo tempo, adoram colocar notinhas na imprensa com todo tipo de especulação.

As eleições no Vasco seriam cômicas, se não fossem trágicas. Entre mortos, clones e sócios subsidiados por algumas chapas, todo mundo pode votar! Para piorar, o risco do retorno de um dos nomes mais funestos da história do futebol é iminente.

A esquisita relação entre o Fluminense e a patrocinadora daria um livro. Ninguém sabe mais onde terminam os sócios e começam os médicos credenciados. Tampouco sabe o que sobraria caso os médicos metessem o pé.

Resumindo, esta turma de dirigentes que foi à Brasília passar o chapéu é lamentável, asquerosa, retrógrada. São uns vendilhões da nossa paixão pelo futebol. Se estivéssemos no Irã, levariam quatro bilhões de chibatadas, uma para cada real devido ao povo brasileiro. Ninguém se salva!


Longe de ser exclusividade do futebol, o presidente do COB diz que a Baía de Guanabara está limpa. Que tal um mergulho?


Valeu,

Bruno Porpetta